Passos e pensamentos - Lutando contra a preguiça (1)
Claro que os pensamentos precisam ser coesos. Não posso ir caminhar pensando na minha agenda profissional, ou qualquer assunto que me acelere descontroladamente o batimento cardíaco e me descompasse o passo. É preciso embalar a fé, motivar a força. Então, além de apreciar a paisagem, tento criar histórias em torno dos ilustres desconhecidos que, à priori, comigo dividem a vontade de adotar costumes saudáveis.
Tem, por exemplo, a senhorita paciência que caminha em câmera lenta para acompanhar seu cachorrinho preguiçoso, a dona camiseta molhada, que exibe seu colar de suor como se fosse uma medalha. Tem o coroa que, na tentativa de equilibrar o peso da pança, caminha com a imponência de importante e rico burguês. O mineirinho com cara e passo de manso e tonso, mas com o olhinho desperto, secando os derriére femininos que sacolejam, naturalmente, involuntariamente, em volta. Os casaizinhos costumeiros, de todas as idades. Alguns caminham de mãos dadas, conversam animados, riem com gosto e eu até me entusiasmo, incrementando minhas passadas.
E tem o meu preferido, o homem bicentenário... velhinho, velhinho. Ele caminha a meio passo, mas caminha, não com a minha preguiça fantasiada de dificuldade, mas com a vontade férrea, que talvez o tenha acompanhado a vida inteira, a vontade de quem não quer parar por nenhuma razão, porque chega uma hora na vida em que ser ou não racional é o que menos importa. O relevante mesmo é simplesmente viver e viver simplesmente, o básico do básico. Usar sabiamente o aprendizado de uma vida inteira, e seguir curioso, sem perder a ambição do conhecimento. Viver apreciando cada minuto, apaixonadamente, sem afobação porque esta é a hora de descobrir e usufruir a verdadeira liberdade, a plena humanidade.
E é assim que, numa simples caminhada, encontro toda a motivação necessária para vencer muito mais que a preguiça, enfrentar a agenda que me espera, sem anseios ou grandes expectativas. Vou percebendo, apreciando, admirando as pessoas em volta, sentindo e escolhendo o ritmo da minha pisada, ora forte, ora indolente, displicente, desligada, de novo animada, o passo firme, seguro de quem sabe para onde vai. Concentrada no caminho, ora sinuoso, ora reto, subindo, descendo, um passo, mais outro, compassado, ritmado, como que acompanhando as notas de uma melodia, percebendo a sinuosidade da vida. Seus altos e baixos, curvas suaves, derrapadas inesperadas, reviravoltas oportunas, um voluntário e atrevido cavalinho de pau, rodopios organizados ou desvairados num grande salão, palco, um ciclo ou um simples trajeto. A vida!
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