Quando a tragédia bate à porta


Recentemente navegando na internet, me deparei com a foto de um casal de artistas que fez muito sucesso nos anos setenta e oitenta. Trata-se de Albano e Romina Power. Ele, um italiano de origem humilde que se tornou um astro da musica romântica já em meados dos anos sessenta, ela, a filha de dois atores famosos de Hollywood, que por várias circunstâncias da vida, se tornou atriz na Itália.
Romina e Albano conheceram-se em 1967, durante a gravação de um musical italiano em que os dois faziam o par romântico. Ela com 16 anos e ele 24, ambos já atores de sucesso e Albano consagrado também como cantor. Em 1970 os dois casavam, com Romina grávida da 1ª filha, Ylenia. Romina gostava de música desde cedo, tocava violão, compunha e cantava, então formar a parceria que os tornaria famosos no mundo, foi um processo natural. O duo Al Bano and Romina Power, é até hoje o casal queridinho dos italianos e de muitos fãs saudosistas que a dupla conquistou pelo mundo.
O casal era admirado não apenas pela música, mas também porque pareciam sempre apaixonados. O sucesso fazia com que fossem fotografados em todo o canto onde passavam, o que não os impedia de ter uma vida normal, ainda mais porque Albano  adquirira terras na pequena Cellino San Marco, sua cidade natal, no Sul da Itália, onde nascera. Ele adquiriu exatamente as mesmas terras em que trabalhara como agricultor junto com sua família. Foi ali que construiu a casa dos sonhos de Romina, conseguindo manter certa privacidade na grande propriedade, onde vivia a família a quem se juntara a mãe de Albano. 
Em Abril de 1973, nascia Yari, o 2º filho do casal. E quando Ylenia estava já com 16 anos e seu irmão com 13, Romina sentiu vontade de ter mais um filho. Aos 36 anos ela se achava mais preparada para a maternidade. Assim nasceu Cristel, em 1985, mas Romina viria a engravidar uma vez mais, nascendo outra menina, em 1987, batizada com o nome da mãe, Romina.

Os filhos apareciam vez ou outra em filmes em que os pais contracenavam. Já adolescente, Ylenia chegou a apresentar-se com a mãe no palco. Muito parecida fisicamente com a avó famosa, logo atrairia a atenção de fotógrafos, acompanhando os pais em muitos eventos artísticos. 
Com o sonho de se tornar escritora, Ylenia fez faculdade na Inglaterra, formando-se com louvor em literatura. Atraída pela cultura de New Orleans, com a qual tivera contato durante uma viagem que a família fizera pelos EUA, para as irmãs menores conhecerem o país da mãe, Ylenia voltou sozinha, disposta a explorar a cultura do local e escrever um livro.

Mas... Ylenia não voltou. A informação é que sumira durante um passeio a cavalo. O ultimo contato seu, foi um telefonema que fez para sua mãe em dezembro, e ainda naquele final de ano, de 1993, Ylenia era declarada desaparecida. Ali começaria o calvário do casal. 
A Imprensa explorou o caso ao máximo, gerando especulações em torno das poucas informações. Apesar de todos os procedimentos comuns à situação, com apelos do casal pela TV, cartazes com a foto de Ylenia espalhados pelo local, um prêmio chorudo em dinheiro, para quem fornecesse qualquer informação válida, todas as buscas e investigações da polícia resultaram infrutíferas, nem mesmo o detetive contratado conseguiu avançar na investigação.  Tudo o que surgia de informação resultava em frustração, mas o que mais indignava e exasperava o casal era a Imprensa publicar toda e qualquer história, antes mesmo da polícia averiguar, sem qualquer respeito ou sensibilidade pela tragédia familiar. 
Para a mídia tudo relacionado ao caso era produto valioso resultando em maior tiragem e vendas. Tratava-se de uma tragédia real com todos os elementos presentes que garantiriam o sucesso de qualquer ficção. 
O público ávido por notícias, estava sempre buscando novidades do caso, afinal o drama envolvia o casal de artistas queridinho da Itália e da Europa. Por ter acontecido nos EUA e envolver a filha e a neta de Tyrone Power, artista há muito falecido, mas querido de Hollywood, o caso estava presente na mídia mundial. E como sempre tem gente que quer tirar qualquer proveito, histórias não faltavam. 
Uma testemunha disse ter visto uma moça muito parecida com Ylenia, se jogando nas águas frias do Mississipi, anos depois a filha de um serial killer surgiu com uma história que Ylenia era uma das vítimas do pai, o corpo de uma jovem sem identificação apareceu na California e foi logo estampado nas manchetes, sugerindo-se sutilmente ligação com Ylenia, algo que ocupou as conversas até sair o resultado do exame de DNA, na época demorado, para diluir as especulações. Mas a versão que dura até hoje, é de que Ilenia estaria viva. Esta versão tem outras vertentes, uma é de que Ylenia estaria num convento, outra é que teria sua própria família...  

           Romina e as filhas, frequentemente
             postam fotos de Ylenia, e seu aniversário            
           é lembrado nas redes sociais.
Enquanto isso, o casal, com duas filhas pequenas, tentava seguir com a vida. Romina, mais retraída que Albano, ia se refugiando num mundo à parte, aos poucos foi sumindo dos palcos e da TV. Seu fascínio pelo misticismo da Índia, país com o qual teve contato durante as filmagens de um seriado filmado naquele país, fê-la mergulhar no Hinduísmo, para desgosto de Albano, que crescera em lar católico, assim como a própria Romina. 
Como todo bom italiano, Albano levava a religião muito a sério, o que incluía respeito aos símbolos religiosos. Um dia Romina adquiriu uma imagem do Deus Ganesha, entidade invocada para destruição de obstáculos, e o colocou num altar, no lugar della Madonna, em sua casa. Albano ficou chocado, sem nada entender nem sentir qualquer interesse por religiões indianas, achou uma profanação colocar o que para ele era uma aberração, uma estatueta com corpo de gente e cabeça de elefante, no lugar da Virgem Maria.
Um abismo foi se formando entre o casal. Cada um sentindo a tragédia a seu modo. Albano, mais pragmático, aceitou que sua filha havia morrido, algo que Romina não admitia. Nos seis anos seguintes, ela surgia esporadicamente nos palcos, uma sombra de tristeza marcando seu semblante. O sorriso fácil e aberto, que lhe dava o ar juvenil, era raro, apenas um esboço de outrora, os olhos sem brilho e o semblante sério mostrava a mulher de meia idade. 
Romina começou a sentir falta de suas origens, de sua família, e que a vida que levava não era dela, até mesmo o sucesso nos palcos via como exclusivo de Albano. Um dia percebeu-se uma estranha no ninho, nada ali era a sua vida, nem mesmo a casa que Albano construíra ao seu gosto. E de repente, o país que chamava de sua segunda casa, não lhe parecia tão acolhedor. Incomodava-a a Imprensa, sempre com mexericos em torno de sua vida, de sua separação de Albano, que acontecera em 1999. Ela queria dedicar-se a outras atividades que mantinha, como a escrita e a pintura, chegando a fazer exposições de seus quadros. Apareceria na TV ainda outras vezes como convidada, ou apresentadora, assim como se separara de Albano, também o fizera com a cantora. Em 2007 conseguiu finalmente comprar uma casa em Sedona, no Estado do Arizona, partindo definitivamente da Itália.   
Albano, por sua vez, sentiu-se perdido por um tempo, a separação da família, levou-o pelo caminho dos sedativos, longe dos palcos e tentando encontrar um novo caminho sem a família, acabou perdendo a fé, até que se deu conta que estava num processo de autodestruição. Ele falaria anos depois que esperou por oito longos anos que Romina voltasse para casa. Voltou aos palcos, colocou a vida em ordem e logo conheceria uma nova companheira, com quem teve mais dois filhos, numa relação que durou 15 anos.

Em 2013, 14 anos depois, Romina e Albano encontraram-se novamente nos palcos. A mágica aconteceu pela ousadia de um empresário russo do showbiz, fã da dupla, que apostou alto. O publico foi ao delírio. Uma gritaria histérica de fãs emocionados, vivendo a realização de um sonho que parecia impossível. O sucesso na Europa foi tão estrondoso que i due cantanti estão até hoje fazendo shows. Ainda que Albano se tenha separado da última companheira, a relação com Romina segue na base da amizade, do coleguismo e a nível profissional, e quando sobem ao palco, soltam a voz e cantam com o coro sempre entusiasmado do público, revivendo com eles os seus grandes sucessos, um deles... Felicitá!

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