“Busca e acharás”

Eu sou o caminho, a verdade e a vida (João 14:6).” 
pergaminho2

Jesus tinha uma extraordinária compaixão pelo seu semelhante, entendia suas limitações emocionais e tentou arrancar o véu da ignorância em que permanecemos mergulhados, acordando nossa consciência. Assim quando ele disse “eu” não se referia a si mesmo em particular. Ele, eu, você, todos nós somos o caminho, a verdade e a vida, porque a sabedoria está dentro de cada um.

Algumas pessoas levam uma vida se anulando, ou empurrando para debaixo do tapete elementos conflitantes nas relações afetivas: casais, irmãos, pais e filhos, amigos ou colegas de escola e de trabalho. Esta forma de agir está bem distante do saudável, o futuro para estas pessoas pode ser bem solitário, sofrido e até curto. Claro que tem quem circula no mundo sem grandes dramas, indivíduos que escolhem um terceiro caminho - o equilíbrio.

Bernardo faz faculdade e mora numa república. Ele divide o quarto com um colega e dorme na parte de baixo do beliche. Muito organizado, pediu educadamente umas três vezes ao colega que não jogasse as roupas na sua cama. O outro concordava, mas no mesmo dia quando Bernardo voltava da faculdade, assim que abria a porta sentia que acabava de entrar em uma pocilga. Um dia simplesmente decidiu relevar os 10 minutos que tirava diariamente de seu tempo para deixar o seu espaço com aparência de limpo, e lembrar que vivia uma situação temporária, priorizando, desta forma, a harmonia.

Nem todo o mundo, claro, possui a mesma compreensão. O exemplo da situação acima poderia chegar a tal extremo que obrigaria à mudança de um dos rapazes. É interessante e ao mesmo tempo triste notar que conflitos, aparentemente, se originam, pelas razões mais insignificantes. A intolerância é um traço da humanidade, e a origem de grandes males. A bagunça em si pode ser pivô de divergências de muitos relacionamentos, mas excessos à parte, as tempestades em copos d’água podem ter uma origem bem mais profunda.

O ideal seria que todos reagissem com certo equilíbrio às contrariedades, com o pensamento no bem comum, no coletivo. Um mínimo de bom senso já evitaria muito estrago. O problema é que assim como há pessoas que se deixam dominar pela agressividade, aquele tipo que gosta de repetir, ou avisar “Não me pisem nos calos”, tem também o oposto, os que acham que vieram ao mundo para sofrer e vivem numa ladainha de lamúrias e autocomiseração.

As pessoas agressivas precisam de muito pouco para surtar. Sua leitura mental das situações é bem paranóica. Altamente competitivas, a toda a hora precisam sentir que estão no comando, ou melhor, ter a certeza que ninguém as controla ou que estão se aproveitando delas. E, por serem excessivamente sensíveis à crítica, muito cuidado com as observações que se faz a seu respeito, dependendo da interpretação que elas fazem, num minuto pode-se estar gargalhando junto e no seguinte sendo atacado de todo o jeito.

Estas pessoas são boas de ofender, de se fazerem superiores e dependendo da situação, podem até se fazer de vítimas, isto porque seu ego é exacerbado. E a coisa não pára por aí, enquanto o outro está ainda tentando entender como uma brincadeira tomou tal proporção, o suposto ofendido já está espalhando sua versão equivocada do episódio.

Claro que dias depois há um clima aparente de harmonia, mas que ninguém se engane, pessoas agressivas não deixarão passar a oportunidade de jogar na cara do outro a “grosseria” ou “maldade” ou como quer que seja que sua miséria afetiva, muitas vezes uma patologia, interprete os fatos. Psicólogos apontam o receio da exclusão como pivô do desequilíbrio, daí estes indivíduos estarem sempre prontos a pularem no ringue e distribuírem socos gratuitos.

Trata-se de um exemplo do tipo de personalidade com que podemos nos deparar, ou com quem precisamos forçosamente conviver no dia a dia, seja na pessoa de um colega, amigo ou parente. Difícil? Muito, mas todos podemos desenvolver formas de contornar estas situações, encontrarmos em nós mesmos mecanismos que nos ajudem, nos protejam de cairmos na armadilha do desentendimento, num bate boca estressante por conta de ignorância ou patologia, de uma ou outra parte ou de ambas.

Por esses dias assistindo um programa na TV, deparei-me com a história de um assassino confesso que acordou a consciência ao se ver frente a frente com os pais de uma de suas vítimas. O seu olhar cruzou com o do pai do rapaz que ele baleara e ao perceber o profundo sofrimento daquele homem, ele sentiu pela primeira vez empatia, segundo suas palavras “... vi pela primeira vez os outros como pessoas.” Depois disso ele passou a vida se martirizando pelo que fizera.

Agora bem mais velho ele ainda chora a violência estúpida. Na entrevista o homem conta como mergulhou dentro dele mesmo, refletiu sobre sua vida, seus atos, procurando leituras que o ajudassem a entender o que fez, a conviver com os atos passados e a encontrar uma forma de se reparar “não diante da sociedade”, mas para conseguir conviver consigo mesmo.

O indivíduo acima referiu-se a ele mesmo, várias vezes, como um animal. Felizmente nem todos somos assassinos. A evolução emocional ocorre em todas as criaturas em diferentes níveis. Isso é notório. Temos dentro de nós instintos ainda primitivos, o bem e o mal, a bela e a fera, o príncipe e o sapo. As armadilhas estão em todo o lugar e por conta disso, os conflitos internos e externos proliferam, mas quando nos questionamos dramaticamente, como Hamlet “ser ou não ser...”* já é uma vitória.

Embora se escute muito que o cenário atual estimula o individualismo,  o que explicaria o aumento da violência no mundo, eu acho bastante questionável. O que vivemos hoje é uma liberdade maior de agir, sendo que uma boa parcela da humanidade não possui compreensão/inteligência emocional suficiente para utilizar de forma equilibrada, ou civilizada, essa liberdade. A maioria dos indivíduos acredita que as coisas se conseguem na base da força, não tem qualquer empatia com o próximo, não percebe que a sua luta, é a luta do outro e que duas forças, ou melhor, duas inteligências no mesmo compasso somam milagres.

Relações humanas - convivência social -, é uma problemática com que todos temos de lidar porque afinal cada um é um gerador de conflitos em potencial. É aqui que entra a consciência, a informação, a auto-crítica, a reflexão, a busca enfim pelo equilíbrio emocional e isto está ao alcance de todos. Sem auto-análise dificilmente poderemos melhorar o convívio social, o ambiente em que vivemos e circulamos. Corremos o risco de vivermos aos chutes e bolachadas, como se fôssemos perseguidos pelo mundo, ou em lamúrias cansativas como se esquecidos de Deus.

* Hamlet

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